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a majestade, o Sabiá.



By  bomdiathams     segunda-feira, abril 27, 2015     
Trezentos e sessenta e cinco dias é o tempo aproximado que a Terra demora pra dar uma volta completa em torno do Sol.
Nós somos absolutamente insignificantes na lógica do universo. Nós não alteramos a rota da terra. Passarão anos, décadas e séculos e o mundo continuará seu ciclo. O que ninguém me ensinou sobre o tempo é justamente como suportá-lo. Quando você torna alguém seu Sol, como é possível viver o tempo depois que escurece?
A lição mais dolorosa sobre a partida é justamente aprender que as pessoas se vão.
365 dias atrás eu estava nessa mesma casa. Dávamos uma festa. Num minuto de silêncio, encostei numa porta, sozinha, e olhei pro céu. Até hoje eu não sei o porquê, mas meus olhos se prenderam na madrugada escura e pareciam se despedir. Como eu ia saber que há 400 quilômetros de distância você estava justamente se despedindo?
Eu quase não consigo aceitar que o tempo tenha passado. O tempo, esse que te roubou de mim. Esse que finge amenizar a saudade mas que me surpreende num dia qualquer com uma fotografia nossa caída no chão do quarto, que explode numa bomba de choro e saudade. Esse que me faz ver os olhinhos cansados de outras vovós sorridentes pelo parque e me faz desejar que fossem os seus perto de mim. Esse que me fez ter coragem, só um ano depois!, de abrir as fotos da sua última viagem.
Foi um ano inteiro sem escutar sua voz melodiosa arriscando músicas que eu nunca conheci. Foi um ano inteiro sem sentir suas mãos quentes me apertando durante perguntas que nunca acabavam. Foi um ano inteiro sem poder te olhar nos olhos claros de velhice. Foi um ano inteiro suportando uma cadeira vazia durante o almoço. Foi um ano inteiro procurando por você nas festas de família sabendo que você nunca chegaria. Foi um ano inteiro pensando no próximo inverno e sabendo que não poderia dizer pra você se cuidar e se cobrir. Foi um ano inteiro sem seus perfumes, sem poder te contar minha vida, sem te ver com roupas brilhantes, sem dizer que te amo.

Vovó me fez sabiá. Aceito a missão de voar pra ser tudo aquilo que ela se orgulhou um dia.

"- O que será que é a morte? - perguntei.
- A gente fica vivo ainda... mas sem as pessoas verem."

Pela saudade que não passa nunca. Te amo pelo tempo que for.
27/04.



Sobre bomdiathams

Escrevo porque não sei lidar. Por isso sou tentativa, despedida, impossibilidade que termina em tempestade. Escrevo porque não me resta alternativa se não derramar. Escrevo pra me livrar, ser um dia livre - e inconstante, como todas as minhas nuvens. (Jornalista, militante e capitã da areia.)

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