Enquanto absorto num mundo de livros, uma súbita volta a superfície trouxe uma lembrança sua.
Antagônicos em interesses, ele na mesa, com os braços jogados por cima de cadernos e anotações, concentrado em números, contas e fundamentos. Ela na cama, nua, com o bico do seio apontando a parte do poema que dizia "...quem desenha meus amores são as minhas conveniências..."
Ele a observava de bruços sobre seu colchão, apertando contra o rosto seu travesseiro. Os desenhos que a janela costumava fazer refletem no corpo branco dela, reluzindo formas abstratas, códigos indecifráveis oscilando com o movimento do sol, entre suas pernas, suas costas, seus contornos.
Ela olha. Ele sorri... A lembrança se dissipa.
Com a mesma velocidade em que a cama perdeu o calor dela, as memórias insistem em voltar, enquanto eu caminho pela rua, ou quando sozinho em casa, ou ainda durante o banho, preocupado com o horário... Tudo tem de ser imediatamente parado pra que eu possa contemplar a pontada no peito com gosto de saudade. Vontade de voltar. Vontade de mudar. Vontade de ir embora, como você foi...
De volta a minha cadeira agora fria, procuro outro livro pra ocupar a mente atormentada.
Mas quando o abro, encontro dentro dele seu perfume espalhado pelas páginas.
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